21 novembro, 2006

O Tribunal de Contas na Jurisprudência

Apresentamos, a seguir, uma seleção da Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e outros Tribunais acerca de aspectos polêmicos pertinentes (organização, composição e funções) aos Tribunais de Contas.

1. Provimento dos Cargos de Ministros/Conselheiros
“Tribunal de Contas Estadual. Conselheiros. Nomeação. Qualificação profissional formal. Notório saber. A qualificação profissional formal não é requisito à nomeação de Conselheiro de Tribunal de Contas Estadual. O requisito notório saber é pressuposto subjetivo a ser analisado pelo Governador do Estado, a seu juízo discricionário.” (STF, AO 476, Rel. Min. Nelson Jobim, DJ 05/11/99)

Tribunal De Contas. Nomeação de seus membros em Estado recém-criado. Natureza do ato administrativo. Parâmetros a serem observados. Ação Popular desconstitutiva do Ato. Tribunal de Contas do Estado de Tocantins. Provimento dos Cargos de Conselheiros. A nomeação dos membros do Tribunal de Contas do Estado recém-criado não é ato discricionário, mas vinculado a determinados critérios, não só estabelecidos pelo art. 235, III, das disposições gerais, mas também, naquilo que couber, pelo art. 73, par. 1., da CF. NOTORIO SABER - Incisos III, art. 235 e III, par. 1., art. 73, CF. Necessidade de um mínimo de pertinência entre as qualidades intelectuais dos nomeados e o oficio a desempenhar. Precedente histórico: parecer de Barbalho e a decisão do Senado. AÇÃO POPULAR. A não observância dos requisitos que vinculam a nomeação, enseja a qualquer do povo sujeitá-la a correção judicial, com a finalidade de desconstituir o ato lesivo a moralidade administrativa. Recurso extraordinário conhecido e provido para julgar procedente a ação. (STF, 2a. Turma, RE 167137 / TO - TOCANTINS, Min. PAULO BROSSARD, DJ 25-11-1994)

Agravo de Instrumento. Nomeação de Ministro do Tribunal de Contas da União. Controle Judicial. Legitimidade.
1. Competência do Poder Judiciário para controlar o ato de nomeação de ministro do Tribunal de Contas da União, no tocante aos requisitos previstos no artigo 73, § 1º, incisos I a IV, da Carta Magna Federal. 2. Agravo de instrumento a que se nega provimento.
(TRF 1a. Região, Agravo de Instrumento nº 2003.01.00.029237-2/DF, Rel. Des. Fed. DANIEL PAES RIBEIRO).

2. Escolha dos Ministros/Conselheiros - Critério de Origem
“Tribunal de Contas da União. Composição. Vinculação de vagas. Inteligência e aplicação do artigo 73, § 2°, incisos I e II da Constituição Federal. Deferimento cautelar. O Tribunal de Contas da União é composto por 9 Ministros, sendo dois terços escolhidos pelo Congresso Nacional e um terço pelo Presidente da República (CF, artigo 73, § 2°, incisos I e II). O preenchimento de suas vagas obedece ao critério de origem de cada um dos Ministros, vinculando-se cada uma delas à respectiva categoria a que pertencem. A Constituição Federal ao estabelecer indicação mista para a composição do Tribunal de Contas da União não autoriza adoção de regra distinta da que instituiu. Inteligência e aplicação do artigo 73, § 2°, incisos I e II da Carta Federal. Composição e escolha: inexistência de diferença conceitual entre os vocábulos, que traduzem, no contexto, o mesmo significado jurídico. Suspensão da vigência do inciso III do artigo 105 da Lei n° 8.443, de 16 de julho de 1992, e do inciso III do artigo 280 do RITCU.” (ADI 2.117-MC, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ 07/11/03)

3. Ministério Público junto aos Tribunais de Contas
"Ministério Público junto ao TCU - Instituição que não integra o Ministério Público da União - Taxatividade do rol inscrito no art. 128, I, da Constituição - Vinculação administrativa à Corte de Contas - Competência do TCU para fazer instaurar o processo legislativo concernente à estruturação orgânica do Ministério Público que perante ele atua (CF, art. 73, caput, in fine) - matéria sujeita ao domínio normativo da legislação ordinária (...). O Ministério Público que atua perante o TCU qualifica-se como órgão de extração constitucional, eis que a sua existência jurídica resulta de expressa previsão normativa constante da Carta Política (art. 73, § 2º, I, e art. 130), sendo indiferente, para efeito de sua configuração juridico-institucional, a circunstância de não constar do rol taxativo inscrito no art. 128, I, da Constituição, que define a estrutura orgânica do Ministério Publico da União. O Ministério Público junto ao TCU não dispõe de fisionomia institucional própria e, não obstante as expressivas garantias de ordem subjetiva concedidas aos seus Procuradores pela própria Constituição (art. 130), encontra-se consolidado na 'intimidade estrutural' dessa Corte de Contas, que se acha investida - até mesmo em função do poder de autogoverno que lhe confere a Carta Política (art. 73, caput, in fine) - da prerrogativa de fazer instaurar o processo legislativo concernente a sua organização, a sua estruturação interna, a definição do seu quadro de pessoal e a criação dos cargos respectivos." (ADI 789, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 19/12/94)

"O Ministério Público especial junto aos Tribunais de Contas — que configura uma indiscutível realidade constitucional — qualifica-se como órgão estatal dotado de identidade e de fisionomia próprias que o tornam inconfundível e inassimilável à instituição do Ministério Público comum da União e dos Estados-membros. Não se reveste de legitimidade constitucional a participação do Ministério Público comum perante os Tribunais de Contas dos Estados, pois essa participação e atuação acham-se constitucionalmente reservadas aos membros integrantes do Ministério Público especial, a que se refere a própria Lei Fundamental da República (art. 130). O preceito consubstanciado no art. 130 da Constituição reflete uma solução de compromisso adotada pelo legislador constituinte brasileiro, que preferiu não outorgar, ao Ministério Público comum, as funções de atuação perante os Tribunais de Contas, optando, ao contrário, por atribuir esse relevante encargo a agentes estatais qualificados, deferindo-lhes um status jurídico especial e ensejando-lhes, com o reconhecimento das já mencionadas garantias de ordem subjetiva, a possibilidade de atuação funcional exclusiva e independente perante as Cortes de Contas." (ADI 2.884, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 20/05/05)

"A questão pertinente ao Ministério Público Especial junto ao Tribunal de Contas Estadual: uma realidade institucional que não pode ser desconhecida. Conseqüente impossibilidade constitucional de o Ministério Público Especial ser substituído, nessa condição, pelo Ministério Público Comum do estado-membro. Ação Direta julgada parcialmente procedente." (ADI 2.884, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 20/05/05)

4. Tribunais de Contas dos Estados e Municípios: Adoção do Modelo Federal
"Os Tribunais de Contas estaduais deverão ter quatro Conselheiros eleitos pela Assembléia Legislativa e três outros nomeados pelo Chefe do Poder Executivo do Estado-Membro. Dentre os três Conselheiros nomeados pelo Chefe do Poder Executivo estadual, apenas um será de livre nomeação do Governador do Estado. Os outros dois deverão ser nomeados pelo Chefe do Poder Executivo local, necessariamente, dentre ocupantes de cargos de Auditor do Tribunal de Contas (um) e de membro do Ministério Público junto à Corte de Contas local (um). Súmula 653/STF. Uma das nomeações para os Tribunais de Contas estaduais, de competência privativa do Governador do Estado, acha-se constitucionalmente vinculada a membro do Ministério Público especial, com atuação perante as próprias Cortes de Contas." (ADI 2.884, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 20/05/05). No mesmo sentido: ADI 397, Rel. Min. Eros Grau, Informativo 395.

"É firme o entendimento de que a estrutura dos Tribunais de Contas dos Estados-Membros deve ser compatível com a Constituição do Brasil, sendo necessário, para tanto, que, dos sete Conselheiros, quatro sétimos sejam indicados pela Assembléia Legislativa e três sétimos pelo Chefe do Poder Executivo. Precedentes. Há igualmente jurisprudência consolidada no que tange à clientela à qual estão vinculadas as nomeações do Governador. Apenas um provimento será de livre escolha; as duas vagas restantes deverão ser preenchidas, necessariamente, uma por ocupante de cargo de Auditor do Tribunal de Contas e a outra por membro do Ministério Público junto àquele órgão. (ADI 3.361-MC, Rel. Min. Eros Grau, DJ 22/04/05).

5. Revisibilidade Judicial dos Julgamentos de Contas
AO APURAR A ALCANCE DOS RESPONSAVEIS PELOS DINHEIROS PUBLICOS, O TRIBUNAL DE CONTAS PRATICA ATO INSUSCEPTIVEL DE REVISÃO NA VIA JUDICIAL A NÃO SER QUANTO AO SEU ASPECTO FORMAL OU TISNA DE ILEGALIDADE MANIFESTA. MANDADO DE SEGURANÇA NÃO CONHECIDO. (STF, Pleno, MS n° 7280, Min. Henrique D'avilla, DJ 17.09.1962)

6. Tribunal de Contas e as Sociedades de Economia Mista
"O TCU não tem competência para julgar as contas dos administradores de entidades de direito privado. A participação majoritária do Estado na composição do capital não transmuda seus bens em públicos. Os bens e valores questionados não são os da administração pública, mas os geridos considerando-se a atividade bancária por depósitos de terceiros e administrados pelo banco comercialmente. Atividade tipicamente privada, desenvolvida por entidade cujo controle acionário é da União." (STF, MS 23.875, Rel. Min. Nelson Jobim, DJ 30/04/04)

"Ao Tribunal de Contas da União compete julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo poder público federal, e as contas daqueles que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário (CF, art. 71, II; Lei 8.443, de 1992, art. 1º, I). As empresas públicas e as sociedades de economia mista, integrantes da administração indireta, estão sujeitas à fiscalização do Tribunal de Contas, não obstante os seus servidores estarem sujeitos ao regime celetista." (MS 25.092, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ 17/03/06)

7. Atos sujeitos a registro

"O ato de aposentadoria configura ato administrativo complexo, aperfeiçoando-se somente com o registro perante o Tribunal de Contas. Submetido à condição resolutiva, não se operam os efeitos da decadência antes da vontade final da Administração." (MS 24.997, Rel. Min. Eros Grau, DJ 01/04/05)

EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. PENSÃO. TCU: JULGAMENTO DA LEGALIDADE: CONTRADITÓRIO. DECADÊNCIA. I. - O Tribunal de Contas, no julgamento da legalidade da concessão de aposentadoria ou pensão, exercita o controle externo que lhe atribui a Constituição Federal, art. 71, III, no qual não está jungido a um processo contraditório ou contestatório. II. - Precedentes do Supremo Tribunal: MS 24.859/DF e MS 24.784/PB, Ministro Carlos Velloso, "DJ" de 27.8.2004 e 25.6.2004. III. - Inaplicabilidade, no caso, da decadência do art. 54 da Lei 9.784/1999. IV. - A acumulação de pensões somente é permitida quando se tratar de cargos, funções ou empregos acumuláveis na atividade, na forma permitida pela Constituição. RE 163.204/SP, Ministro Carlos Velloso, "DJ" de 31.3.1995. V. - MS indeferido. (STF, Tribunal Pleno, MS n° 25.256/PB, Rel. Min. Carlos Veloso, DJ 24.03.2006)

EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. PENSÃO. T.C.U.: JULGAMENTO DA LEGALIDADE: CONTRADITÓRIO. PENSÃO: DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. I. - O Tribunal de Contas, no julgamento da legalidade de concessão de aposentadoria ou pensão, exercita o controle externo que lhe atribui a Constituição Federal, art. 71, III, no qual não está jungindo a um processo contraditório ou contestatório. Precedentes do STF. II. - Inaplicabilidade, no caso, da decadência do art. 54 da Lei 9.784/99. III. - Concessão da pensão julgada ilegal pelo TCU, por isso que, à data do óbito do instituidor, a impetrante não era sua dependente econômica. IV. - M.S. indeferido. (STF, MS n° 24.859/DF, Rel. Min. Carlos Veloso, DJ 04.08.2004)

EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. PENSÃO. TCU: JULGAMENTO DA LEGALIDADE: CONTRADITÓRIO. MANDADO DE SEGURANÇA: FATOS CONTROVERTIDOS. I. - O Tribunal de Contas, no julgamento da legalidade de concessão de aposentadoria ou pensão, exercita o controle externo que lhe atribui a Constituição Federal, art. 71, III, no qual não está jungido a um processo contraditório ou contestatório. Precedentes do STF. II. - Inaplicabilidade, no caso, da decadência do art. 54 da Lei 9.784/99. III. - Fatos controvertidos desautorizam o ajuizamento do mandado de segurança. IV. - MS indeferido. (STF, Tribunal Pleno, MS n° 25.440/DF, Rel. Min. Carlos Veloso, DJ 15.12.2005)

EMENTA: Mandado de Segurança. 2. Acórdão do Tribunal de Contas da União. Prestação de Contas da Empresa Brasileira de Infra-estrutura Aeroportuária - INFRAERO. Emprego Público. Regularização de admissões. 3. Contratações realizadas em conformidade com a legislação vigente à época. Admissões realizadas por processo seletivo sem concurso público, validadas por decisão administrativa e acórdão anterior do TCU. 4. Transcurso de mais de dez anos desde a concessão da liminar no mandado de segurança. 5. Obrigatoriedade da observância do princípio da segurança jurídica enquanto subprincípio do Estado de Direito. Necessidade de estabilidade das situações criadas administrativamente. 6. Princípio da confiança como elemento do princípio da segurança jurídica. Presença de um componente de ética jurídica e sua aplicação nas relações jurídicas de direito público. 7. Concurso de circunstâncias específicas e excepcionais que revelam: a boa fé dos impetrantes; a realização de processo seletivo rigoroso; a observância do regulamento da Infraero, vigente à época da realização do processo seletivo; a existência de controvérsia, à época das contratações, quanto à exigência, nos termos do art. 37 da Constituição, de concurso público no âmbito das empresas públicas e sociedades de economia mista. 8. Circunstâncias que, aliadas ao longo período de tempo transcorrido, afastam a alegada nulidade das contratações dos impetrantes. 9. Mandado de Segurança deferido (STF, Tribunal Pleno, MS n° 22.357/DF, Min. Gilmar Mendes, DJ 05.11.2004)

EMENTA: Mandado de Segurança. 2. Cancelamento de pensão especial pelo Tribunal de Contas da União. Ausência de comprovação da adoção por instrumento jurídico adequado. Pensão concedida há vinte anos. 3. Direito de defesa ampliado com a Constituição de 1988. Âmbito de proteção que contempla todos os processos, judiciais ou administrativos, e não se resume a um simples direito de manifestação no processo. 4. Direito constitucional comparado. Pretensão à tutela jurídica que envolve não só o direito de manifestação e de informação, mas também o direito de ver seus argumentos contemplados pelo órgão julgador. 5. Os princípios do contraditório e da ampla defesa, assegurados pela Constituição, aplicam-se a todos os procedimentos administrativos. 6. O exercício pleno do contraditório não se limita à garantia de alegação oportuna e eficaz a respeito de fatos, mas implica a possibilidade de ser ouvido também em matéria jurídica. 7. Aplicação do princípio da segurança jurídica, enquanto subprincípio do Estado de Direito. Possibilidade de revogação de atos administrativos que não se pode estender indefinidamente. Poder anulatório sujeito a prazo razoável. Necessidade de estabilidade das situações criadas administrativamente. 8. Distinção entre atuação administrativa que independe da audiência do interessado e decisão que, unilateralmente, cancela decisão anterior. Incidência da garantia do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal ao processo administrativo. 9. Princípio da confiança como elemento do princípio da segurança jurídica. Presença de um componente de ética jurídica. Aplicação nas relações jurídicas de direito público. 10. Mandado de Segurança deferido para determinar observância do princípio do contraditório e da ampla defesa (CF art. 5º LV). (STF, Tribunal Pleno, MS n° 24.268/MG, Rel. Min. Ellen Gracie, Rel. Acor. Min. Gilmar Mendes, DJ 17.09.2004).

8. Função Corretiva do Tribunal de Contas
"O Tribunal de Contas da União, embora não tenha poder para anular ou sustar contratos administrativos, tem competência, conforme o art. 71, IX, para determinar à autoridade administrativa que promova a anulação do contrato e, se for o caso, da licitação de que se originou". (MS 23.550, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 31/10/01)

19 novembro, 2006

Evolução das funções econômicas do Estado

1. Mercantilismo (Século XVI - XVIII)

Segundo Aliomar Baleeiro (in Uma introdução à ciência das finanças, 14a. ed., Forense, Rio de Janeiro, 1995):

"O mercantilismo nasce após a formação das grandes monarquias, a partir do Século XVI. Nacionalista e intervencionista, preconiza para o Estado uma política econômica e financeira fundada na maior posse do ouro e dinheiro, acreditando que nisso reside a base da prosperidade. Dai aconselhar a proibição de saída do ouro e defender o saldo favorável da balança de comércio, graças à expansão do comércio internacional, a das manufaturas e direitos aduaneiros protecionistas.

Em finanças, os mercantilistas tendem para a expansão das despesas públicas, e, conseqüentemente, para o incremento da tributação que as torne possíveis. Aconselham a gravação dos impostos de importação com espírito confessadamente protecionista ao extremo. A política econômica e fiscal de COLBERT (1619-1683) e, depois, a do Marques de Pombal (1699 - 1782) exemplificam a influência do pensamento mercantilista sobre os homens d'Estado da época."

2. Liberalismo. Escola Clássica.

Surge em oposição à visão mercantilista.

Dentre os seus maiores expoentes, destaca-se Adam Smith que escreveu, em 1776, a obra "The Wealth of Nations" (A riqueza das nações). Nesta obra, conforme relata Joseph E. Stiglitz (in Economics of the public sector, 3a. ed., WW Norton & Company, 2000), o Smith tenta demonstrar como a competição e a motivação pelo lucro leva os indivíduos, na busca de seus próprios interesses privados, a servir ao interesse público. A motivação pelo lucro levaria os indivíduos, competindo entre si, a fornecer os bens que os indivíduos desejam. Somente as empresas que produzissem o que os consumidores desejassem e pelos menores preços possíveis poderiam sobreviver no mercado. Desta forma, a economia era levada, como que por uma Mão Invisível, a produzir o que era desejado e da maneira mais eficiente possível.

Com relação às funções do Estado, Smith e seus seguidores acreditavam que "a ação do Estado deveria restringir-se ao mínimo indispensável, como a defesa militar, a manutenção da ordem, a distribuição da justiça e pouco mais, pois a iniciativa privada, na opinião deles, fazia melhor uso dos recursos do povo. Quanto mais este poupasse, tanto maiores seriam os capitais que se orientariam para a produção, engendrando com ela a prosperidade social. O gasto público importa puro consumo de riquezas, na opinião deles" (Cf. Aliomar Baleeiro, op. cit.).

No tocante às finanças públicas, os seguidores da Escola Clássica recomendavam "como regra pacífica o equilíbrio orçamentário. As despesas deveriam ser as menores possíveis e não mereceriam apreciável espaço nos tratados. O melhor governo seria o que governasse menos, a melhor despesa, a menor possível. O empréstimo deveria constituir recurso extraordinário, exigido pela guerra e justificado por empreendimentos reprodutivos e auto-amortizáveis. A finalidade das instituições deveria ser puramente fiscal, isto é, arrecadar fundos para o Tesouro, abstendo-se de reger ou alterar a estrutura econômica ou política da sociedade. Essa concepção tradicional é designada como a das 'Finanças Neutras'".

3. Estado do Bem-Estar Social (Welfare State)

Surge após a Grande Depressão iniciada em 1929, com o "Crash" da Bolsa de Valores de Nova York, estendendo-se por quase toda a década de 1930. Seus efeitos principais, que incidiram sobre diversos países, não somente nos Estados Unidos, mas também na Europa, foram os altos índices de desemprego e uma queda acentuada no Produto.

Ainda durante a Grande Depressão, John Maynard Keynes, economista inglês, rompendo com a Escola Clássica, escreveu a obra "General Theory of Employment Interest and Money" (1936), na qual defendia uma maior intervenção estatal com vistas a assegurar o pleno emprego da economia e atenuar as flutuações da economia.

O Estado do Bem-Estar Social surgiu em resposta à Grande Depressão.

Nos Estados Unidos, "em resposta à depressão, o governo federal não somente efetuou papel ativo na tentativa de estabilizar o nível da atividade econômica, mas também aprovou uma legislação destinada a atenuar vários dos problemas específicos: seguro-desemprego, seguridade social, seguro federal para os depositantes, programas federais destinados a suportar preços da agricultura e um conjunto de outros programas visando diversos objetivos econômicos e sociais. Juntos, estes programas foram chamados de New Deal" (Joseph Stiglitz, op. cit.).

Segundo o Novíssimo Dicionário de Economia (Cf. Verbete "Estado do Bem Estar", Ed. Best Seller, São Paulo, 1999), o Welfare State constitui:

"Sistema econômico baseado na livre-empresa, mas com acentuada participação do Estado na promoção de benefícios sociais. Seu objetivo é proporcionar ao conjunto dos cidadãos padrões de vida mínimos, desenvolver a produção de bens e serviços sociais, controlar o ciclo econômico e ajustar o total da produção, considerando os custos e as rendas sociais. Não se trata de uma economia estatizada; enquanto as empresas particulares ficam responsáveis pelo incremento e realização da produção, cabe ao Estado a aplicação de uma progressiva política fiscal, de modo a possibilitar a execução de programas de moradia, saúde, educação, Previdência social, seguro-desemprego e, acima de tudo, garantir uma política de pleno emprego. O Estado do bem-estar corresponde fundamentalmente às diretrizes estatais aplicadas nos países desenvolvidos por governos social-democratas. Nos Estados Unidos, certos aspectos do Estado do bem-estar desenvolveram-se particularmente no período de vigência do New Deal".

Nesta época, o Estado passou a intervir intensa e diretamente na economia por meio das suas empresas estatais. É o chamado Estado Empresário, que assumiu contornos gigantescos em diversos países.

No Brasil, a atuação das empresas estatais se estendeu nos setores de siderurgia, mineração, telecomunicações, aviação, exploração e refino de petróleo, dentre outros.

4. Estado Neoliberal (1980/90 até os dias atuais). Reforma do Estado

A partir das décadas de 1980 e 1990, a crise fiscal, o início do processo de globalização da economia e a ineficiência do Estado na produção de bens e serviços colocou em xeque o modelo do Estado do Bem-Estar Social.

Acerca da Crise Fiscal, Fábio Giambiagi e Ana Cláudia Além (in Finanças Públicas - Teoria e Prática no Brasil, 2a. ed., Campus, Rio de Janeiro, 2000) esclarecem que:

"A partir da crise de fins da década de 1970, a crescente deterioração das contas públicas na maioria dos países do mundo, refletida, principalmente, em um aumento progressivo do endividamento público pôs em xeque o Estado keynesiano-desenvolvimentista.

Nos países desenvolvidos, a crise fiscal refletiu, em grande medida, do lado da despesa, a rigidez e ampliação das transferências sociais - em razão da universalização da cobertura e sua vinculação aos rendimentos dos trabalhadores ativos -, e do lado da receita, a dificuldade de promover aumentos adicionais da carga tributária, que já havia se elevado consideravelmente no período pós-segunda guerra.

Na América Latina, por sua vez, a deterioração fiscal esteve estreitamente ligada à crise da dívida externa do início da década de 1980 e à conseqüente interrupção dos fluxos de financiamento externo. A crise também se refletiu em uma deterioração da situação econômico-financeira das empresas estatais, o que decorreu, principalmente, de sua utilização como instrumento de política econômica: seja na manutenção do reajuste de tarifas abaixo da inflação - com objetivos antiinflacionários-. seja pelo alto endividamento dessas empresas em razão da necessidade de captação de recursos externos."

A crise fiscal implicou no esgotamento do modelo de investimento estatal, observando-se, segundo Fábio Giambiagi e Ana Cláudia Além (op. cit.), uma deterioração do estoque de capital em infra-estrutura, estrangulando-se os setores-chave para a retomada do desenvolvimento econômico.

Neste contexto, o Estado privatizou empresas estatais, abstendo-se de intervir diretamente na economia, e passou a assumir um papel de regulação, com vistas a reduzir o poder dos monopólios e estimular a competição, garantindo a qualidade dos serviços prestados.